sábado, 31 de julho de 2010

Norma Ativa

Minha vida anda cheia de incoerências gramaticais. Estou cada vez mais anômala, defectiva. Em um período composto por tantas reticências, ninguém consegue me conjugar. Talvez porque seja muito irregular. Faltam-me predicativos, o que torna os sujeitos cada dia mais ocultos ou até inexistentes. Preciso me valer das orações ou então fazer analise: sintática e morfológica, se bem que ando desconfiada de que, o que me falta mesmo é uma boa colocação pronominal, em mesóclise, de preferência.
Os adjuntos estão cada vez mais restritivos, quando aparecem, é um verdadeiro fenômeno da natureza! Meu pretérito é sempre imperfeito. Ah que saudade de uma conjunção, de um bom objeto direto. Eu quero mais verbos abundantes, significativos, pelo menos de ligação. Só me resta aproveitar os poucos artigos que ainda me sobraram.
Juro que não estou fazendo gênero nem numero, mas minha vida, antes tão plural é hoje reles singular, faltam-me exclamações e sobram interrogações. Não tenho nem mesmo uma interjeiçãozinha de espanto.
Penso em tentar uma variação lingüística, sei lá, mudar de ares. Não ando em situação de escolher muito, que venha mesmo fora do padrão, o importante é a conjunção!
Quanto às pre posições, é bom que haja antes uma concordancia verbal, o mesmo vale para o uso dos acessórios.

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Professemos


Outro dia me perguntaram por que uma pessoa escolhe ser professor. Não sei. Eu não escolhi, estou certa de que fui escolhida, assim, por alguma força sobrenatural. Quando criança meu sonho era ser rica e importante, mas como diz o adágio, Deus não dá asa a cobra. Então, Ele (parafraseando Drummond) decidiu: vai Viviane, ser professora na vida.
Dificilmente um professor enriquece ou ganha status, quase nunca é respeitado ou recebe o reconhecimento que merece, somos os pilares invisíveis da sociedade, sustentamos, desempenhamos um papel vital, no entanto, não somos vistos ou sequer lembrados. Ninguém em sã consciência escolheria ser professor, os que o são devem ser loucos ou vocacionados e os melhores são uma mistura dos dois.
Mas, graças a Deus, nem tudo é tragédia, amo o que faço e faço bem, das lagrimas de frustração aos momentos mais surreais, os meus melhores e piores momentos, foram sem duvida, vividos em sala de aula. Lá que me sinto em casa, pisando em meus domínios.
Acho injusto só reclamar, vale a pena dizer que passo bons momentos ao lado dos meus alunos, que a sala dos professores quase não é freqüentada por mim. Gasto meus intervalos falando de games, em seriíssimas discussões sobre Cavaleiros do Zodíaco ser melhor que Dragon Ball Z e infinitamente melhor que Dragon Ball GT, brigando com quem achou Percy Jackson e o ladrão de raios melhor que O Príncipe da Pérsia, trocando animes e mangás com os garotos, comentando o último episódio de CSI, aconselhando as meninas sobre os garotos e vice versa, enfrentado a fúria delas quando digo que odeio Crepúsculo ou enviando e recebendo arquivos no sense pelo celular.
Me sinto profundamente feliz em ser chamada pelos alunos de “minha linda” e chamá-los “meus queridinhos”, amo rir e me divertir com eles, me emociono quando ganho bilhetes perfumados e coloridos, entregues ao fim da aula com a expressa recomendação “pró, não é pra ler agora não! Só lê quando chegar em casa”, abri-los e decodificar naquele emaranhado de desenhos, adesivos e letrinhas infantis a frase “ Pró, eu te amo”. Acho muito louca essa nossa relação que vai a extremos em fração de segundos. O mesmo aluno que ficou sem intervalo, certamente me maldizendo, é o mesmo que se oferece, todo prestimoso, para carregar meus livros ao final da aula. Nesse relacionamento tão passional, as raivas não duram, nem de um lado nem do outro.
Fico feliz com cada aluno que avança, com cada pedrinha posta no alicerce do aprendizado, a cada livro lido e discutido com prazer, a cada solicitação de novas leituras, a cada flor de hibisco arrancada pelo caminho e trazida já murchinha para minha mesa.
Me divirto pra valer nas aulas do pré vestibular, fico radiante em responder ao sem numero de duvidas e curiosidades, amo ouvir “essa pró é doida”. Gosto de ser abordada pelos corredores para tirar duvidas, de ser acompanhada até o ponto de ônibus em bate papos informais que, às vezes, rendem mais que a aula propriamente dita. Curto nosso papos de ponto de ônibus, em linguagem informal, legitimo baianês corrente nas ruas e nos guetos. A aula do ponto de ônibus, como eles batizaram, dispensa a língua vernácula, sou melhor entendida quando digo que “Gregório de Matos é o cara do barroco, porque detonava geral a galera do poder”, antes que o normativos me apedrejem, nunca deixo de falar sobre a importância da Norma, filha de D. Diz Gramática.
Como bem definiu a Professora Doutora Alana el Fahl, conheço as dores e delicias do magistério. Quero continuar a vivê-las, quero o doce, suporto o amargo, vou assim sendo, pois de outra forma eu não saberia ser. Sou professora para poder ser sempre aprendiz, para me reencontrar criança em cada aluno, para descobrir neles amigos. Apesar de todos os pesares, sou professora, amo minha profissão, amo “meus queridinhos” que me enlouquecem, me desesperam e me realizam e tenho muito orgulho de tudo isso. Aos loucos e/ou vocacionados escolhidos pelo destino, façamos o que melhor sabemos. Professemos.



segunda-feira, 26 de julho de 2010

Veneno

_Pimentah , conheci uma garota...

_Hum, bonitinha?

_Linda!

_Ah, então deve ser burra...

_Na verdade, ela é PHd.

_Aff, deve ser chaaaaata.

_Adora piadas e tem um ótimo senso de humor.

_Essas, são as piores, provavelmente é mau caráter e egoísta.

_Ela faz trabalhos voluntários aos fins de semana.

_Vai fazer jogo duro, botar a maior banca.

_Eu já peguei.

_Aha! Aposto que é frígida.

_Bom, ela teve orgasmos múltiplos.

_Certamente fingiu.

_Algumas coisas sabe, reações físicas, evidencias, se é que me entende, não dá pra fingir.

_Cuidado viu, ela deve ser dessas gangues que aplicam golpes.

_Mas eu sou pobre.

_Acorda, deixa de ser babaca. Essa mulher é falsa.

_Como você pode ter tanta certeza?

_Porque se eu tivesse um clone, com certeza saberia!

Para Isa Tucci, que só pra me matar de raiva, é linda, inteligente e gente boa.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Eu, livro e capa


As pessoas têm memória curta, fato! Às vésperas da minha colação de grau, já emendando uma pós graduação, começa a tarefa indigesta de convidar algumas pessoas para a cerimônia. Nesse dia tive noção de como  elas têm memória fraca ou então, muita cara de pau!
Quando eu era criança, os vizinhos e parentes tinham uma opinião quase unânime sobre mim: isso não vai ser coisa preste! Ok, admito que era meio moleque (no masculino mesmo), chegando ao cumulo de que, algumas pessoas nem sabiam que eu era menina, pois escondia meus vestidos em lugar super secreto e vestia as roupas reserva que meu irmão levava por baixo das dele, e assim gastei a infância, em brincadeiras de moleque, ou bem baianamente dizendo, solta de corda e canga, perdida na buraqueira.
Foram incontáveis surras e castigos inenarráveis até que minha mãe me “entregasse nas mãos de Deus” e se resignasse a esperar pelo “pior”, baita contra-senso né?
As pessoas estavam sempre tão ocupadas em me fazer prognósticos funestos, que ninguém percebeu que aprendi ler “de ouvido” aos cinco anos de idade, minha mãe era faxineira em uma escola particular, como não tinha onde me deixar eu ia junto, assim, ouvindo as aulas, sentada no pátio ao lado da sala de aula, aprendi ler e escrever, em um tempo em que, aos cinco anos, as crianças estavam começando na escola. Prestavam mais atenção à minha próxima aprontação, e como eu aprontava. Mas que fique claro, apenas gostava de brincar, correr, nadar, talvez mais que outras crianças, sempre fui superlativa.
Passou-se o tempo e a coisa “piorava”, durante a adolescência, veio o quarteto maravilha, eu, Geisi, Poli e Kelly, fim de semana sim outro sim, estávamos nós onde houvesse uma lata batendo. Os prognósticos pioraram, e muito. Nossa alegria, vivacidade e falta de preocupação com a opinião alheia, incomodava muita gente. Vieram os olhares tortos, as opiniões divergiam em: “isso não vai acabar bem” e “certamente isso não vai acabar bem”. Bom, como sempre fomos do contra, hoje Poli é mestranda em Sistemas Elétricos pela UFBA; Geisi cursa medicina na Universidade de Havana, Cuba; Kelly, enfermagem na UEFS e eu, bem, isso vocês já sabem.
Não sou de me alegrar com as tragédias alheias nem digo isso com jubilo, mas a metade das “santinhas” que tanto nos esfregaram na cara, hoje são mães solteiras, abandonaram a escola e vivem em subempregos.
Nessa sociedade, em que se julga o livro pela capa, nunca fui indício de boa leitura, talvez por não ter sido “igualzinha a todas as meninas da minha idade”, por nunca ter rezado pelas cartilhas, por nunca ter seguido os padrões. Fui considerada rebelde sem causa, apenas porque o desejo de liberdade, de pé descalço no chão, de banho de chuva, falava mais alto que o resto e me arrastava pra gandaia, talvez por rir alto, por brigar, defender minhas opiniões, por falar a verdade (ah, quantos problemas ganhei, quantas surras levei, por falar a verdade). Fui uma “rebelde’ que nunca tomou um porre, não usou drogas nem nunca beijou um desconhecido numa balada.
Autenticidade assusta as pessoas, a falta de máscaras, a cara limpa é que causa desconfiança.
Voltando à tarefa inglória da distribuição dos convites, que fiz em respeito à memória de minha mãe, que ficaria muito triste se eu não o fizesse, cumpro o velho adágio “por causa dos santos, se adoram as pedras”. Sou recebida com sorrisos, abraços, congratulações. A mesma pessoa que traçou meu destino sombrio há tantos anos, me olha nos olhos e diz com a maior emoção do mundo, “eu sempre soube que você teria muito sucesso em sua vida”.
Respondo incontinenti, “eu também, mesmo quando a senhora me dizia o contrário”.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Esse tal padrão de beleza

Depois de mais uma via crucis pelas lojas de cosméticos, resolvo parar em uma das mais bambambans da cidade. Vago aborrecida pelos corredores, procuro insistentemente (e em vão) a ver se alguma marca, atendendo aos meu vários e mails, já lançou uma linha de produtos para cabelos naturalmente pixaim. Sim, porque se encontram produtos para todos os tipos de cabelos, lisos, alisados, secos, molhados, com química, tingidos, cacheados, exceto para os crespos, rebeldes, indomados, ou seja, os meus. Converso com a vendedora, pergunto se fabricam algo do gênero, ele me conduz até a seção dos “cacheados”, olho para ela com meu olhar mais bondoso, aquele que faz murchar pimenteira, gentilmente explico: “Ana Paula Arósio tem cabelo cacheado, o meu é pixaim mesmo”, a mulher me olha como se eu acabasse de me declarar nazista, ou qualquer coisa do gênero. Vai ver ela acha ofensivo ter cabelo pixaim. Em seguida deixo-me conduzir à seção dos “afro”, até que me animo, isso até ler as letras miúdas dos rótulos: “para cabelos danificados e quimicamente tratados”, traduzindo, para “crespas” que queriam ser “lisas” e agora estão com o cabelo detonado. Desisto, me rendo mais uma vez aos produtos para cabelos normais (?), tentando imaginar o que, por definição seria um cabelo normal ou anormal, me convenço que o meu deve ser do tipo anormal, pois a moça que me sorri na embalagem, exibe uma longa cabeleira lisa e esvoaçante.
Vou ao caixa, contrariada mesmo, certas coisas ainda ficam atravessadas na garganta e, se porventura engulo, não consigo digerir. A moça sorridente me comunica que, pelo valor comprado, tenho direito a uma “transformação”, me animo, será que vão me transformar em uma mulher rica, bonita e inteligente?

Sigo uma garota até o salão de beleza que funciona dentro da loja, mais sorrisos me recepcionam, um rapaz me olha com cara de manicure quando olha uma unha encravada e começa a me por a par da situação, se tudo desse certo, em mais ou menos uma hora, eu estaria igualzinha à Rihana, palavras dele, juro! Vai ficar lindo, suspirou afetado, me olhando com a mesma cara que os apóstolos devem ter feito quando disseram ao aleijado: Levanta e anda!

Ele deve ter confundido o meu olhar fulminante com algum tipo de emoção. Esse “vai ficar lindo”, dito assim com tanto entusiasmo, me atingiu com uma bigorna. Fiquei triste, mexida mesmo. Vi com uma nitidez fantástica o quanto as pessoas são influenciadas por essa tal padrão de beleza midiático, o meu cabelo não é lindo, para sê-lo, será preciso um processo químico devastador .

É realmente triste a desvalorização do que é natural, de como ser “normal” perdeu a graça e se tornou um elemento pitoresco. Antes o artificial era que chamava a atenção, hoje atraio olhares por ser, na maioria das vezes, a única “diferente” entre as mulheres em determinados ambientes. Diferente por ser natural.

Engoli a raiva, frustração, sei lá o quê, afinal, brigar com quem? Expliquei que gosto do meu cabelo assim, que o acho lindo e que, se ele pudesse fazer algo para que minha cabeleira se tornasse ainda mais expressiva e opulenta eu aceitaria de bom grado. Saí de lá com algumas dicas e crivada pelos olhares dos curiosos que adorariam ver a tal transformação. Sem duvida me acharam um prato cheio, tipo um poodle preste a virar um Shih-Tzu.

Às vezes até me divirto quando percebo o olhar furioso de algumas mulheres para mim, como se eu fosse uma espécie de traidora, a expor publicamente um tão intimo segredo da maioria das alisadas.

Não levanto bandeira, não sou nenhum tipo de ativista, apenas quero que parem de me empurrar goela a abaixo os padrões, as tendências, os moldes. Eu não quero ser a Rihana, nem parecer com ninguém, quero ter minha cara, meu jeito, quero ser parecida comigo, quero que entendam: eu gosto do meu cabelo pixaim, gosto de ser quem sou e da menina que me olha todos os dias do espelho, não tenho problemas em estar fora dos padrões, e quer saber, abusada e convencida como sou, sou feliz em SER meu próprio padrão.









Segredos





O que dizer, quando me roubastes as palavras



E, enquanto me embriaga com as tuas



Me deixas assim, boba e calada?



O que fazer quando se quer dizer tudo



Sem precisar falar nada?



Como conter o que, por si só



Já não se basta?



O que fazer? O que dizer? Como conter?



Não digo nada, sei que me entendes



Mesmo muda, calada



Não me contenho, sei que me cuidas



Quando estou entregue, derramada



Não nos conceituemos, somos inéditos.



Não nos preocupemos



Em inventar ou descobrir palavras.


Viviane

terça-feira, 13 de julho de 2010

Sou mulher à moda antiga


Numa boa, essa conversa de igualdade de sexos não é pra mim. Podem chamar de retrógrada, alienada ou simplesmente de atrasada, mas ainda acho que homem é homem e mulher é mulher. Defendo a igualdade de direitos, mas nunca a igualdade de sexos. Admito sem problema algum que sou frágil, quero cuidado e proteção de um representante do sexo oposto, me reconheço incapaz de realizar certas atividades tipicamente masculinas, como abrir vidro de conserva, exercer os ofícios de pedreiro e estivador, andar sem camisa em dias de calor e fazer xixi em pé. Aceito humildemente minha inabilidade com raciocínio lógico, a capacidade de me perder a duas quadras de minha casa e a dificuldade homérica em lembrar de um percurso antes de percorrê-lo, pelo menos umas cinqüenta vezes.

Não sou nem quero ser igual a homem algum. Como mulher, já tenho problemas e encargos suficientes, não quero somar a estes os que viriam com essa tal igualdade.

Imagine se depois de sofrer horrores na manicure, de ter um pedaço da alma esfacelado a cada puxada de cera quente em lugares delicados e de difícil acesso, de suportar horas em um salto alto e envergar com garbo e elegância um vestido que faz morrer de frio, depois de ter passando metade do dia brigando com o cabelo para que ele finalmente fique do jeito que gosto, depois de ter despendido meia hora fazendo a maquiagem que pouco tempo depois irei levar mais meia hora pra tirar e depois de tudo isso ainda ter que rachar ou pagar ou a conta. Desculpa, eu não sou masoquista!

Eu mereço contas pagas, portas abertas, cadeiras puxadas, flores, presentes, dengos, mimos e cada elogio. Eu sou sexo frágil!

Gosto da diferença, da completude, dessa coisa caramelo meio a meio, não acho bacana mulher macho, durona e sisuda que, infelizmente está contribuindo para o desaparecimento do cavalheirismo, não existe cavalheiro sem dama. Assim como também não curto essa onda de (kilo) metrossexual, não digo que o homem seja um ogro, mas depilar a virilha já é muita informação pra mim. Onde fica a ancestral sensação de pelo na pele? Sério mesmo, em um relacionamento quem usa maquiagem e desenha sobrancelha sou eu. Não me imagino disputando o hidratante para pele sensível com um namorado ou marido.

Eu posso me virar sozinha e cuidar de mim mesma. Posso, mas não quero!

Que fique claro, não estou aqui defendo a inferiorização da mulher nem a supervalorização do homem. Ser feminina, frágil, delicada, sim. Mas não apenas isso. Podemos garotas, conquistar nosso lugar ao sol, ou a chuva de acordo com nossas vontades, podemos exercer cargos de chefia ou qualquer outro e, para tantos temos competência de sobra, o que não podemos é, por conta disso perdermos a leveza e a boniteza de ser mulher. Deixar o encantamento do sorriso e leve balanço no caminhar. Mostrar que temos a mesma competência que os homens não significa que devemos nos masculinizar. O que eu não quero é perder minha graça. O ideal é poder fazer o que quero e gosto, conquistar meu espaço e respeito e o mais importante, usando salto.



domingo, 11 de julho de 2010

Versos para Raphael

Versos para Raphael




Era pra ser uma dedicatória

Acabou virando poema

Fazer o que?

Sou boa de história

E ninguém manda na pena.*

Minha pena tem vida própria

Escorrega, desliza, caminha

Ela que leva minha mão

Ela caminha sozinha

Escreve a imaginação

E cria um mundo só para ti.

Lá você é quem quiser

E a todo lugar podes ir

Podes ser príncipe valente

Podes ser rio corrente

Viver em castelos de areia

Ser encantador de sereias.

Ser pirata, capitão

Voar sem tirar o pé do chão.

Podes inventar uma língua só tua

Podes ser rei da terra e da lua

Podes ser destemido cowboy

Super-poderoso-herói.

Num estalar de dedos

Um novo universo criar

E se ficar entediado

Podes tudo desmanchar.

Podes conhecer o mundo

Este e quantos desejar

E quando, e se quiser

Podes simplesmente voltar.

Eis meu presente pra ti

Tinta, papel e pena

Sonhos, carinhos,

Poema!

Você mesmo um perfeito poema

Divinamente rimado

Pela mão do Mestre criado.

De tudo que eu possa te dar

Eis meu melhor pra você

As coisas que mais gosto no mundo:

Rimar e amar você.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Crônicas tiradas da aula


I
Aluno 1: A pró é Viviane que nem a mulher da novela...
Aluno 2: Eita, que diferença! a pró é..., pró, como é que se diz que a pessoa é preta sem ser xingando?


II

Aluno 1: Pró, sinonimo é quando uma palavra quer dizer a mesma coisa que a outra né?
Professora: Isso mesmo, palavras com mesmo valor semântico.
Aluno 1: porra, a pró falou bonito agora.
Aluno 2: claro né, cavalo! a pró é professora!

domingo, 4 de julho de 2010

cotidiano


_ Boa noite, querido.

_Boa noite, te amo.

_Te amo também..., desliga?

_Ah! não, desliga você.

_Mas eu desliguei ontem.

_E eu nas dez vezes anteriores.

_Poxa, desliga vai.

_Já falei que não quero.

_O que é que custa?

_Porra, você é chata viu. Não desligo e acabou!

_Você é que é um grosso!

_Claro, você acaba a paciência de qualquer um.

_Tá bom, não quer desligar não desliga.

_ (...)

_ Depois não reclama da conta de energia.

_Diabo de mania sua, de esquecer essa lâmpada ligada...

sábado, 3 de julho de 2010

A Venus e as mulheres




Venus nunca foi menina, já nasceu mulher, portanto não conhece a beleza de descobri-se nem de ser descoberta. Ela nasceu perfeita, divina perfeição, o que nunca lhe permitiu o jubilo de aperfeiçoar-se. A mais linda e sensual de todas as deusas e mortais. Venus nunca soube o que é ser bonita somente para alguém em especial.

Venus nasceu pronta, lapidada, não soube o que é ser moldada por mãos habilidosas, nunca soube o que é ser conduzida nem teve despertos seus sentimentos em fúria e fogo, nunca teve rubor nas faces nem sentiu as pernas tremulas. Venus nasceu nua, não sabe o belo que é ser despida ou despir-se. Por ser todo tempo e por todos admirada, não sentiu o peso de um olhar especial sobre si, a lhe atravessar o corpo e desvendar-lhe a alma, perscrutando íntimos segredos, e desconhecidas emoções. Tão humanas emoções. Ela nunca baixou os olhos por não suportar um olhar lhe adivinhando o que se passava em seu coração.

Da sua concha, surgiu deusa, nunca foi grão de areia a ferir o sensível molusco, não passou pelas fases tantas até se tornar perola. De tão universal, Venus nunca soube o que é ser única. Da espuma, do sal, do mar, surgiu num ímpeto, num átimo. Não soube o que é pacientemente abrir-se, despertar, desabrochar, não soube o que é ter alguém a espera para vê-la sair da concha.

Ainda bem que tamanha perfeição e completude cabe apenas às deusas, nós mulheres mortais, fomos meninas, concha, perola, espuma e sal, iguais a nós, tantas outras, no entanto, para alguém, em algum momento, seremos especiais.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Fuga para a chuva


A menina caiçara, que ainda vive em mim, às vezes foge do porão e vai fazer traquinagem. Solta das amarras, convenções, podes não podes, ela sai assim, de chinela e saia de chita, de cabelo assanhado, boca cheia de um sorriso tão genuíno, que por não caber por dentro, se derrama pelo caminho.

Ela, menina há muito tempo aprisionada, calçada, vestida, envernizada. Ela que hoje já não para ver o sol, que já não se demora em brinquedos de moleques a beira do rio. Já não salta mais cancelas, não se mete mais com meninos ciganos a jogar dados viciados e perder bolas de gude de estimação. Ela que há muito, já não chora de medo de causos de assombração.

A menina ribeirinha, que comia juá no pé, que jogava pião, roubava peixe na rede alheia e tomava banho de rio em dia de chuva (a água fica tão morninha), que tocava campanhia e corria, que vestia roupa do irmão pra melhor aprontar das suas sem estragar o vestidinho de menina (este ficava muito bem guardado em esconderijo secreto até a hora de voltar pra casa), que tantas vezes deixou a mãe alucinada, a imaginar seqüestros, roubo de órgãos, atropelamentos, afogamentos e tantas outras desventuras que só as mães conseguem arquitetar, a menina que apanhava de cinta para aprender ficar em casa, e que no dia seguinte, esquecidas a dor da surra e as lagrimas, ia-se de novo mundo afora, um mundinho bem pequeno, é verdade, tanto que seus pés ligeiros e suas pernas esguias davam conta de correr em um só dia.

Ah, essa menina, que nunca foi flor que se cheirasse...

Hoje vive no porão, um lugar úmido e escuro, com cheiro de guardado e saudade. Ainda que alimentada, com esforço resguardada, lhe falta um tantão assim de liberdade, de gosto de pé descalço no chão quente de cascalho, do cheiro de melancia na cheia do rio e da sensação de barro molhado nas mãos. Ainda que amarrada, pelas convenções, contida, de vez em quando ela apronta, ludibria e, sabe-se lá como, saí por aí assim, descalça, vestida de chita, solta de corda e canga e vai tomar banho de chuva.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Eu também sou Dona Flor



Pensei em intitular esse texto, “Toda mulher é Dona Flor”, mas como ainda não recebi procuração para falar em nome do gênero, decidi falar por mim, quem quiser, ou se identificar, se aproprie do conteúdo e, faça suas, minhas peripécias.

Pois bem, eu sou toda Dona Flor, essa mesma, a do amado Jorge, a que tinha dois maridos. Antes de julgá-la (e a mim também), vale a pena conhecê-la. Moça bonita, formosa, toda fornida de carnes, prendada até não mais. Flor, brejeira e romântica, casta e pudica a desabrochar em dengo e no gosto da vadiagem com o ardente Vadinho, seu marido primeiro, depois contida senhora, séria e honestíssima Floripes, a do doutor Teodoro, marido segundo. Entre um e outro, Flor escolhe os dois.

Sim, eu também sou dona Flor, quero o safado Vadinho para a cama e a vadiagem, quero que tire meu chão, me faça sentir mulher, me olhe com desejo e me encha de tesão. Quero a mão safada, a frase sacana dita ao pé do ouvido durante a ceia de Natal em casa daquela tia velha, quero o amasso no cinema, o beijo exagerado roubado no portão de casa, o convite inusitado e fora de hora (se é que existe hora) para a cama ou qualquer outro lugar, desde que seja com péssimas intenções, quero o cara machão, que briga e sai batendo a porta me deixando a falar sozinha, que volta trazendo flores, desfaz minha cara amarrada e me deixa ficar por cima. Quero o Vadinho sem freio, que me faça ter ciúmes e diga ao meu ouvido: “deixa de besteiras, mulher mesmo, pra valer, só tu mesmo, Flor minha”.

Mas quero também Teodoro, que me faça musicas e poemas, que me fale de estrelas e constelações, que me chame “meu amor”, mande flores, puxe cadeiras e abras portas. Quero o companheiro atento, fiel e dedicado, que me cuide quando doente, que ria de minhas piadas e me pergunte sobre meu dia, quero que me elogie e me encante, seja zeloso, protetor e ande comigo de mãos dadas. Que me faça um amor tranqüilo, que me cubra de beijos mornos e me chame de todos os diminutivos do mundo. Quero Teodoro que sempre volte pra casa e, em dias de chuva, me deixe dormir recostada em seu peito. Quero o romance cotidiano e a sensação de proteção.

Agora o que quero mesmo, é tudo isso num combo. Quero que os homens acordem, aprendam a olhar mais de perto. Que asim como eu, e tantas outras mulheres, somos todas dona Flor, sejam também os homens, Teodoro e Vadinho em um só. Fariam tão mais felizes, esposas, namoradas, ficantes, casos, peguetes ou qualquer outro desdobramento.

Ah! Se vocês, homens, entendessem isso, essa coisinha tão simples, essa dualidade das fêmeas, esse ambíguo desejo. Ah se vocês entendessem...

Quantos chifres seriam evitados...




Requiem


Um dia eu quis fazer algo diferente...
Me disseram que se o fizesse
Certamente iria me arrepender.
Não o fiz.
E como me arrependo...

Viviane do Carmo